RELER: Onde está minha gente? Parte 2
de
Notícias Recon
05 de junho de 2020
Por ThatSandy, da Equipe Recon
Originalmente publicado na Recon Issue_01
[Continuação da Parte 1]
O usuário Recon IndigoFFenix diz "Pelo fato de eu ser negro e curtir couro, as pessoas geralmente assumem que sou ativo, e se você ler o meu perfil, saberá que não é isso que sou." Continuando a falar sobre o estigma de homens negros submissos na cena, ele diz "Não é muito tabu para você dizer que chicoteou alguém, ou mijou em alguém ou bateu em alguém, mas quando você diz que foi chicoteado, foi mijado ou foi fistado, é muito mais tabu porque mexe com essa ideia de o que significa ser masculino, que por sua vez é um grande problema."
Sentimentos parecidos ecoam na comunidade Latina. Os membros da ONYX Richard e John-John trazem para esta discussão o fato de serem referidos como "exóticos" e confundidos um com o outro quando saem. Entretanto, eles abordam essas situações com um grau de empatia. Richard pondera: "Em 9 das 10 vezes, nós seremos sexualizados por causa da natureza da cena. Isso faz dela errada? Não necessariamente, mas se você acha que ser sexualizado é incorreto, então o objetivo é corrigir a ação."
Como fazer isso não é claro, mas LeathermanLynx me diz onde ele está em sua jornada em relação ao assunto. "Eu não sou responsável nem tenho controle sobre como outra pessoa me vê. Se alguém se excita pensando em mim... então ok, nós teremos bons momentos. Uma vez que eu não seja desrespeitado, desvalorizado ou humilhado sem permissão, faça o que quiser porque você também é muito atraente para mim."
Minha conversa com o pessoal da ONYX ilustra as barreiras e os problemas que os homens de cor podem enfrentar dentro da cena fetichista. Eu já testemunhei o que acontece quando essas barreiras são removidas e o impacto que isso tem nos grupos minoritários. Eu me lembro de, em 2015, usar uma foto retratando Yoshi Kawasaki para a Full Fetish San Francisco. Yoshi é um homem incrivelmente tesudo do Japão. Na noite da festa, eu estava na porta. Um homem chinês tímido veio me perguntar se ele poderia entrar. Eu pedi para ver o gear dele. Ele estava usando o combo harness-jockstrap e eu disse que é claro que ele poderia entrar. Ele perguntou se poderia voltar mais tarde e não pegar a fila porque ele precisava fazer uma ligação. Eu disse que sim. 30 minutos mais tarde, ele estava de volta com 10 amigos. No próximo dia na feira, eles vieram na nossa tenda nos agradecer e se juntaram ao redor do banner com o Yoshi para tirar uma foto com ele.
Me entristeceu o fato de que este homem e seus amigos sentiram que precisariam de permissão para fazerem parte de nosso evento, mas me inspirou a fazer um trabalho melhor em relação as imagens e aos conteúdos promocionais do Recon. O conteúdo que produzimos deve refletir toda a comunidade e incorporar pessoas de todas as raças, formas e tamanhos. Richard também toca neste assunto, dizendo "Todas as imagens da cena são muito brancas, então você está alienado se estiver fora disso. Precisamos conversar sobre o porquê de haver esta divisão." Desde este momento, eu e minha equipe temos nos esforçado para mostrar usuários e modelos de uma grande variedade de origens, mas o trabalho está em andamento, e nosso objetivo é trazer ainda mais mudanças onde for possível.
Eu também tomei uma decisão consciente de mostrar mais o meu lado fetichista, especialmente nas redes sociais, assim alguém que se parece comigo não precisará ter permissão para explorar e encontrar a si mesmo. Quando eu digo isso a Daddy Sage, ele responde "Muitos de nós não entendem que quando você se mostra assim, muitas pessoas verão você e dirão... Aaah, eu posso fazer isso?" Richard completa dizendo "Faça bastante barulho na internet. Você é uma conexão para as pessoas que não tem os privilégios e oportunidades que você tem, não apenas para elas serem elas mesmas, mas para compartilhar com as pessoas aquilo que elas amam ou que desejariam fazer. Você pode fazê-las serem livres."
A visibilidade dos homens de cor na cena parece ser uma solução comum quando conversamos com os rapazes da ONYX sobre como podemos fazer com que mais grupos étnicos se sintam inclusos. Falar pode ser mais fácil do que fazer, já que é preciso muita coragem para se fazer visível.
Master Joshua, também morador de Nova Iorque e educador de princípios do estilo de vida BDSM ainda diz "Nós temos que quebrar os estereótipos que nos colocam por não sermos héteros. Esses sentimentos que a sociedade coloca nos homens de cor relacionados a serem gays ou fetichistas, vindos de amigos e família, nos fazem ficar dentro do armário. Se nos assumirmos como homens leather, sempre haverá a preocupação sobre o que os outros pensarão de nós. Sair de casa assim pode mexer com os nervos, mas se você chegou tão longe, por que não dar o próximo passo? Apresente-se em outro bar. Convide um de seus amigos e vá junto."
Eu também reconheço que existe muito trabalho a ser feito, e de todos os setores da sociedade. IndigoFFenix diz, "Nós, como pessoas negras precisamos parar de dizer que é sujo o comportamento gay ou qualquer coisa que não seja padrão. Devido a opressão e a pressão da religião, é da natureza humana validar a si próprio tomando-se como melhor que o outro. Isto também vale para os grupos minoritários. Os negros descontam suas frustrações nos gays. Como resultado, os homens gays negros são deslocados de suas comunidades. Mas ainda há tribos dentro da comunidade gay que precisam de validação, e, como resultado, acabam rebaixando outras, também. O ódio internalizado é segmentado e mais difícil de ser identificado."
Então onde isso nos leva? Todo esse assunto é um campo minado, mas assim como em outras áreas, a resolução do problema começa com entendimento, pequenas ações e apoio mútuo. Ações como minha missão de colocar conteúdos mais representativos no Recon podem parecer muito pequenas, mas a força de se ver representado nas redes sociais não pode ser negada. Você pode ver na cultura mainstream o impacto e a importância de filmes recentes como Pantera Negra ou Asiáticos Podres de Ricos como exemplos que se destacam. Não deveria ser grande coisa ter filmes de super-heróis ou comédias românticas estrelando pessoas de cor, mas já que é o caso, precisamos continuar caminhando com o assunto. E daí, quando o assunto é apoio e desenvolvimento, grupos como o ONYX são exemplos vivos de que, se pessoas como você podem caminhar no mundo fetichista, você também pode.
Por fim, a intenção deste artigo é iniciar um diálogo, compartilhar onde eu estou em minha jornada fetichista, compartilhar algumas perspectivas alternativas, e, talvez, plantar uma semente sobre este assunto. Todos nós temos a força e o poder necessários para fazermos o melhor e deixarmos nossa cena a mais inclusiva possível, e é o que me esforço a fazer.
Você tem uma perspectiva diferente sobre fetiches e taras e gostaria de compartilhá-la? Mande suas ideias por e-mail para: social@recon.com
Compartilhe